Manuel Queiroz no "I".
1. Declaração de interesses prévia: sou um regionalista, ou seja, defendo a reforma administrativa do Estado de modo a criar as regiões administrativas com o sentido de assegurar um Estado mais descentralizado, mais próximo das populações, e assim mais eficiente.
É que o FMI chegou à Grécia e uma das coisas a que obrigou foi reorganizar o Estado, reduzindo o enorme número de autarquias, para aumentar a eficiência da máquina. O PS já diz, nesta edição doi, que é a favor de uma reforma (veremos qual) e o FMI também pode propor algo assim em Portugal. Relembro que em 1974-75 os consultores internacionais que por cá andavam (incluindo o FMI) já defendiam essa reforma - a regionalização -, que acabou por ser aplicada apenas às chamadas ilhas adjacentes, depois de inscrita para todo o país na Constituição de 1976. Sem mais consequências até hoje, até àquilo que o professor Freitas do Amaral qualificou como "inconstitucionalidade por omissão", já que está inscrita na lei fundamental (embora hoje sujeita a norma referendária).
Os adversários da regionalização fizeram campanha - no referendo de 1998 -, não a favor de um Estado central e centralizador, mas contra muitas coisas, nomeadamente as mordomias que se estenderiam pelo país, com os carros pretos, o pessoal ajudante e tantas outras malfeitorias.
Esse populismo - porque sempre aceitaram que o Estado funcionava mal, com muito desperdício, longe das populações mas nunca propuseram nada para que ele funcionasse melhor - acabou por ter vencimento. E chegámos onde chegámos hoje, com toda a gente a bater no Estado e a achar que ele se reforma "cortando a despesa". Não, só se corta despesa com sentido mudando a lógica do funcionamento do Estado. E uma lógica diferente seria essa, um Estado descentralizado e a ter verdadeira noção do que é necessário em cada lugar. Por exemplo, há Scut que foram feitas, nesse perfil, sem que alguém do poder local as pedisse ou sugerisse. Mas o Estado era rico, precisava de alimentar alguns dos seus barões, e foi gastando. A factura chega sempre. Está a chegar agora.
2. A abrangência é sempre um bom tema em política. O Presidente da República terá os seus antecessores a discursarem no 25 de Abril, num sinal de unidade política; José Sócrates consegue pôr toda a gente do partido a trabalhar para as eleições; Passos Coelho tenta a abrangência fora do partido, incluindo nas listas de candidatos a deputados independentes de alto perfil e diferentes obediências ideológicas. Só que não consegue a abrangência interna necessária, pelos vistos, vendo afastarem- -se (ou sendo afastados, não é claro nalguns casos) alguns militantes conhecidos e importantes. Os barrosistas desapareceram, Marques Mendes e Manuela Ferreira Leite recusaram, Pacheco Pereira desafia directamente o líder por interposto sms, Nuno Morais Sarmento nunca escondeu que não lhe perdoava problemas antigos.
Churchill distinguia, na sua proverbial sabedoria, adversários (os dos outros partidos) e inimigos (os do seu partido). Passos Coelho começa a aprender que é mesmo assim. Não o ajuda o facto de ter apresentado tudo de modo bastante amador, se não mesmo incompreensível, para o comum das pessoas. Vai contar o resultado do dia 5 de Junho, como sempre acontece, mas é perigoso tentar anular uma facção pela extinção. É preciso uma força e um conjunto de argumentos que Passos Coelho ainda não mostrou.
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